Por Fábio Tiepolo

“Acho que a saúde mental é mais importante nos esportes neste momento. Temos que proteger nossas mentes e nossos corpos e não apenas sair e fazer o que o mundo quer que façamos.” (Simone Biles)
Na última terça-feira, dia 27 de julho, a maior estrela da ginástica americana, ganhadora de 30 medalhas em Olimpíadas e Mundiais, a quatro pódios de se tornar a ginasta mais premiada — entre homens e mulheres — da história, Simone Biles, decidiu não competir as finais da categoria individual.
A decisão foi revalidada pela Federação Americana de Ginástica, que disse apoiar a opinião da atleta. “Após avaliação médica adicional, Simone Biles foi retirada da final individual geral dos Jogos Olímpicos de Tóquio com o objetivo de focar em sua saúde mental. Simone continuará a ser avaliada diariamente para determinar se participará ou não das finais de eventos individuais da próxima semana”, informou a entidade em nota oficial. “Apoiamos de todo o coração a decisão de Simone e aplaudimos sua bravura em priorizar seu bem-estar. Sua coragem mostra, mais uma vez, porque ela é um exemplo para tantos”, informou a entidade em nota oficial.
Isso é HISTÓRICO, na verdade.
Porque MUITO se especulou sobre os motivos da desistência da atleta e a principal razão aventada foi a que ela estava sofrendo de BURNOUT devido à enorme pressão psicológica e esforço físico ao qual estava se submetendo para um desempenho condizente ao de primeira ginasta do mundo, esperado por todos.
Após sua apresentação solo, Biles saiu da arena abalada. Sua pontuação foi de 13.766 — a mais baixa no salto olímpico e de sua carreira. O peso de ser a melhor do mundo de todos os tempos acabou cobrando seu preço. Logo após a classificatória, ela escreveu em seu Instagram: “Eu realmente sinto, às vezes, como se eu tivesse o peso do mundo sobre as minhas costas. Eu faço parecer que a pressão não me afeta mas, às vezes, é difícil”.
Falemos sobre burnout, então.
A síndrome do burnout — termo que vem do inglês “queimado” — é um distúrbio psíquico causado pela exaustão extrema, relacionada ao trabalho. Essa condição também é chamada de “síndrome do esgotamento profissional” e afeta quase todas as facetas da vida de uma pessoa. Ela é resultado do acúmulo excessivo de estresse, de tensão emocional, de volume de trabalho e cobrança por desempenho e é bastante comum em profissionais que trabalham sob pressão constante.
A exposição permanente ao estresse, ansiedade, pressão por resultados pode resultar em depressão profunda, o que vai exigir o acompanhamento constante de psicólogos e psiquiatras, isso sem contar com as consequências físicas advindas dessa condição, como gastrite, enxaqueca, taquicardia, aumento ou perda de peso, colesterol e pressão alta, risco de infarto, AVC, entre outros.
A cultura do esgotamento
O Brasil é o quinto país com maior agravamento da saúde mental, segundo pesquisa da Ipsos de janeiro de 2020. Entre os brasileiros, 53% disseram que sua saúde mental piorou nos últimos 12 meses. As circunstâncias da pandemia e do distanciamento social criaram o ambiente perfeito para a proliferação da Síndrome do Burnout. Os trabalhadores passaram a ser cobrados pela mesma produtividade que tinham no escritório, sem levar em conta a rotina enfrentada dentro de casa.
Para superar expectativas e não correr o risco de serem despedidos, muitos estenderam a jornada de trabalho, extrapolando horários e limites na vida pessoal. A comparação com o caso da Simone não é exagerada, caso vocês estejam pensando. Porque o aspecto emocional tem um impacto tremendo tanto na performance dos atletas, de quem se exige resultados sempre acima da média em um ambiente de competição, quanto no mundo corporativo.
A preocupação com a manutenção do emprego acaba criando um ciclo vicioso no profissional: ele passa a trabalhar mais, fica mais esgotado e, por fim, acaba rendendo cada vez menos, já que está doente. Por conta disso, se cobra mais, trabalha mais, se esgota mais… E assim sucessivamente. Se o emocional e o psicológico não estão bem, em meio a um ambiente corporativo de cobrança por resultados, a chance de sucesso cai drasticamente. Isso vale para atletas, executivos e até para os médicos, com os quais trabalhamos diretamente aqui na Docway, profissionais tão fortemente exigidos ao longo da pandemia, na linha de frente para manter a nossa e a sua saúde.
Mas essa cultura da produtividade acima de tudo e de todos não vem de hoje. Ela é o grande regime vigente em grande parte do mundo e amplamente abordada no best-seller do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han, “A Sociedade do Cansaço”. Na opinião do escritor, “vive-se com a angústia de não estar fazendo tudo o que poderia ser feito” e, se você não é um vencedor, a culpa é sua. “Hoje a pessoa explora a si mesma achando que está se realizando”, diz ele. E a consequência: “Não há mais contra quem direcionar a revolução, a repressão não vem mais dos outros”.
É preciso revolucionar o uso do tempo, afirma o filósofo, professor em Berlim. “A aceleração atual diminui a capacidade de permanecer: precisamos de um tempo próprio que o sistema produtivo não nos deixa ter; necessitamos de um tempo livre, que significa ficar parado, sem nada produtivo a fazer, mas que não deve ser confundido com um tempo de recuperação para continuar trabalhando”, conclui.
A importância do autocuidado
Por conta disso, muito se tem falado sobre autocuidado na pandemia. Muitos confundem isso com cuidado com o corpo físico, apesar de isso também impactar em nosso bem-estar psicológico. Mas não se trata apenas de estabelecer uma rotina de exercícios físicos, skincare, ingerir comfort food e consumir entretenimento escapista.
Trata-se de, a exemplo de Simone Biles, desistir para sobreviver. Descer do pódio para repensar seu propósito. “Preciso me concentrar no meu bem-estar, há vida além da ginástica”, disse a atleta. “Há vida além da ginástica” — no caso, muito significativa essa frase vinda de alguém que dedicou sua vida inteira a ser a melhor ginasta.
Reavaliar propósitos é preciso. Fazemos o que fazemos para obter aprovação dos outros ou para satisfação pessoal? Vivemos nossa vida da forma como gostaríamos de viver ou apenas para cumprir convenções sociais?
Nunca o trabalho de psicólogos e psicoterapeutas foi tão importante para nos acompanhar nesses questionamentos. Terapia e acompanhamento psiquiátrico, muitas vezes medicado se houver necessidade, podem salvar vidas. E justamente por isso, aqui na Docway ampliamos nosso corpo de profissionais da saúde, oferecendo aos colaboradores e beneficiários de nossos parceiros o apoio de um time de psicólogos, prontos para ouvir e dar a melhor orientação de maneira acolhedora e humanizada.
E este é um investimento que, corporativamente, faz todo o sentido. Um estudo da Organização Mundial da Saúde (OMS) inclusive demonstra que, para cada 1 dólar investido em tratamento, para transtornos mentais comuns, como depressão e ansiedade, há um retorno de até 5 dólares em melhoria da saúde e da produtividade.
No fim, Simone Biles ousou questionar o status quo, seu propósito e a noção de sucesso. Reavaliando sua trajetória, tirando os olhos de um objetivo externo, e voltando-os para si. Quando estamos extremamente focados em um ponto ou objetivo, nos especializamos, aprimoramos, podemos ser reconhecidos, mas perdemos a chance de enxergar o cenário completo. Na estrada tortuosa e incerta da vida, muitas vezes é preciso parar e olhar ao redor, e quem sabe, ter coragem de mudar os rumos e procurar ajuda para encontrar a paz.
Saúde é tudo.
*Fábio Tiepolo é CEO e Fundador da Docway.
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