O álbum “72 Seasons”, da banda norte-americana, escancara em letras autobiográficas a sua luta contra o vício, ansiedade e depressão
Quando uma banda do tamanho do Metallica lança um disco de inéditas, é inevitável que todo mundo que minimamente gosta de rock preste atenção. É, de fato, um acontecimento. No caso do recém-lançado “72 Seasons”, no entanto, este lançamento se torna duplamente importante, porque as letras escritas pelo vocalista James Hetfield são uma verdadeira aula a respeito de saúde mental. Com um conceito visual todo focado na cor amarela, em clara alusão à cor que usamos durante o Setembro Amarelo, o disco não conta uma única história integrada, mas fala do início ao fim sobre a luta do próprio James contra a ansiedade, a depressão e o seu vício em álcool.
As 72 estações às quais o título do disco do Metallica – em inglês, 72 Seasons – se referem à quantidade de estações do ano (primavera, verão, outono e inverno) que passam ao longo dos primeiros 18 anos da vida de uma pessoa. É na infância e juventude, como sabemos, que se desenha a personalidade e os muitos “eus” que vão nos formar para a vida adulta.
Vindo de uma infância humilde, em um ambiente violento, este James Hetfield que conhecemos do Metallica foi criado no coração de uma família bem religiosa, que não acreditava na medicina – o que lhe tirou a mãe, vítima de câncer, aos 16 anos. De lá pra cá, o músico experimentou uma batalha sem fim com drogas e alcoolismo.
Em meio a uma recente turnê do Metallica, em 2020, antes da explosão da pandemia e do isolamento social, James voltou para mais uma temporada de internação na reabilitação, cancelando uma série de apresentações. “Ser apenas humano nesta carreira traz desafios gigantescos e pode ser muito difícil. A compreensão de vocês é uma cura”, disse ele, em comunicado oficial, quando reforçou que precisaria se dedicar à sua própria saúde mental, fazendo terapia de maneira recorrente.
“72 Seasons” fala muito sobre este momento de James, fala sobre passado e também sobre o presente, sobre o impacto que os traumas da juventude podem ter na vida adulta, tudo tratado de maneira absolutamente autobiográfica. A canção “Room of Mirrors”, por exemplo, fala sobre como não apenas você mas o mundo te enxerga em sua luta contra a depressão (“Would you criticize, scrutinize, stigmatize my pain? / Would you summarize, patronize, classify insane?”). Já “If Darkness Had a Son” é a respeito a eterna tentação de voltar aos antigos vícios, que fica circundando para sempre a vida de quem é adicto.
Um bom resumo do disco “72 Seasons”, definitivamente, é “Screaming Suicide”, exaltação do Metallica sobre a luta diária que é, pra quem enfrenta questões ligadas à depressão, manter os instintos negativos sob controle. Porque, no fundo, este é um disco que pretende trazer uma mensagem positiva. Apesar do sofrimento, sim, ainda há esperança. A luz está lá, no fim do túnel, ainda que muitas vezes seja difícil de enxergar. Segundo o próprio James Hetfield, esta é uma música sobre “abrir a comunicação a respeito da escuridão que sentimos internamente”. E ele ainda reforça para os fãs que “eles não estão sozinhos”.
“É muito importante falar sobre isso”, completa o frontman do Metallica, sempre reforçando que é fundamental procurar ajuda especializada.
Como diz a letra de “Chasing Light”, “without darkness, there’s no light”. Sem escuridão, não existe luz. E precisamos aprender a lidar com ela, sem deixar que ela nos domine.